Seu mais novo longa Assassinos da Lua das Flores é um feliz
respiro no meio de tantos filmes “mais do mesmo”. Como 3 horas e meia de
duração, o filme conta a história real de um povo indígena, os Osage que no início
do século XX descobre uma fonte abundante de petróleo em seu território. Em
pouco tempo os Osage se tornam ricos e começam a conviver com os brancos nas
primeiras formações de cidade. O que acaba atraindo muitos vilões de terno sem
escrúpulos para conseguirem um pouco dessa riqueza. O que se segue é um massacre
tão histórico que faz com uma nova agência de investigação seja criada, o FBI.
O elenco é de uma qualidade já esperada dos filmes de Scorsese.
O casal protagonista principalmente. Mollie (Lily Gladstone) é a principal
força motriz dessa história. Sua energia, determinação e coragem carregam o peso
dramático. É incrível ver como Mollie continua a seguir adiante depois de
sofrer tanto. Seu parceiro Ernest (Leonardo DiCaprio) é provavelmente o
personagem mais complexo da carreira do ator. Ernest oscila entre vilão e
vítima de forma brilhante e a relação de marido e mulher também um dos fios
condutores trama.
Mas o grande vilão da história Bill Hale, interpretado por ninguém
menos que Robert De Niro que como sempre faz um trabalho impecável. Bill é um
monstro cínico, desprezível e repugnante. Há quem tenha cravado o personagem
como o melhor da carreira do ator. A complexidade e as nuances dos atores são a
prova de que o cinema não se resume à blockbusters. O trio com certeza vai
render alguns prêmios em suas estantes.
O respeito e devoção de Scorsese pela arte do cinema não é
novidade para ninguém. O diretor americano de 80 anos se supera mais uma vez no
que já está sendo considerada sua maior obra-prima. Em alguns momentos, os diálogos
misturam o inglês com o idioma dos Osage que não só trazem mais veracidade à
trama, mas ajuda a valorizar a cultura indígena além de sempre deixar em mente
que os Osage são as vítimas aqui.
Conforme a infiltração do homem branco se desenvolve,
Scorsese usa câmeras em primeira pessoa passeando pela região dos Osage, dando
ao espectador a sensação de estar invadindo junto. Apesar de se tratar de um
drama de época, o roteiro é ágil e nenhum de seus 210 minutos é desnecessário
ou mal aproveitado. Martin Scorsese consegue produzir um filme de época, mas
que, ao mesmo tempo é extremamente atual. É impossível não refletir sobre sua
história, visto que nós mesmos, vivemos até hoje em terras indígenas tomadas à
força ou por meio de golpes. Uma representatividade muito bem colocada, que
serve de exemplo para os blockbusters que forçam demais a barra tentando
inserir uma representatividade que mal influencia a trama e só usada para cumprir
uma agenda de fãs.
Não é à toa que Scorsese é um dos maiores diretores de sua
geração. Assassinos da Lua das Flores é cinema em sua mais pura definição e
deve ocupar os melhores lugares nas listas de melhores filmes do ano. Scorsese
não faz apenas filmes, ele faz história. Em uma era de vídeos curtos no TikTok e
reels no Instagram, consumido por uma molecada cada dia mais bitolada e,
portanto, mais ansiosa, Scorsese dá um bom motivo para desligar o celular e se
desligar do mundo por 3 horas e meia. Não apenas isso, com a atual saturação de
serviços de streaming disponível à alguns cliques, o diretor também nos
relembra porque o cinema ainda é sempre será o melhor lugar para se assistir um
filme.