análises errôneas sobre o filme e o cinema brasileiro como um todo.
Moura
optou por humanizar o personagem-título de seu filme. Afinal, Marighella foi e
ainda é visto por muitos como o “inimigo numero 1”, o “terrorista comunista” e
um “extremista”. Com planos fechados e médios, o filme foca nas reações e
humanidade dos personagens que lutam contra um regime completamente sádico.
O roteiro
de Felipe Braga é uma adaptação do livro Marighella – O Guerrilheiro que
Incendiou o Mundo e possui uma trama eficiente, poderosa e fácil de acompanhar.
A ambientação de uma época tão sombria é colocada em tela de forma impecável, e
provam que Wagner Moura é tão bom diretor quanto ator, talvez até melhor.
O filme ainda
traz uma balança moral. Ao longo da história Marighella teve sua humanidade
apagada pelos registros por adotar uma atitude mais “olho por olho” para lidar
com as atrocidades do regime militar. Justificado apenas pelo fato de que os
crimes praticados pelos militares eram muito mais cruéis, Carlos Marighella é tido
como um herói revolucionário. Essa balança e muito bem construída e
representada durante suas mais de duas horas de duração, que por sinal, passam-se
sem que o espectador fique cansado.
A entrega
de Wagner Moura, seu elenco e sua equipe fazem de Marighella um dos melhores filmes
brasileiros da história recente. O longa amplia o escopo não só da
personalidade que foi Carlos Marighella, mas de toda a ditadura militar no geral.
Moura entende o poder de uma obra cinematográfica e transmite todo o peso da
luta a favor da democracia sem o menor pudor, medo ou hesitação.
Com uma
imposição física ativa, somada a um olhar lacrimoso que mostram as perdas
pessoais por conta de uma vida entregue à luta por um ideal, Jorge alia
imponência e vulnerabilidade em seu melhor trabalho no cinema até hoje. Além
disso, a pele negra do ator aumenta ainda mais o teor político, explicitando a
identidade racial e incorporando na crítica a opressão ditatorial e a denúncia
do racismo estrutural no Brasil.
O longa
tem causado reações diversas, sobretudo entre aqueles que apoiam o atual governo
e é compreensível. O filme de Moura toca em uma ferida ainda muito delicada para
o povo brasileiro e procura uma certa reparação histórica em sua essência. Mas
mais do que isso, Marighella uma exposição de fatos, e contra fatos não há
argumentos. E o fato é que desde que o atual governo se instalou, o cinema
brasileiro entrou num coma profundo e a Ancine está às moscas. Tanto que os
únicos dois filme brasileiros de destaque esse ano foram este, e os dois longas
sobre Suzane Richthofen.
Marighella
é uma obra de arte e um respiro no cinema brasileiro. É também a prova irrefutável
que arte e política se misturam e são intrínsecos. Um filme de conteúdo
histórico, brutal, cru, e ao mesmo tempo atual, relevante, ousado, poderoso e principalmente
independente.