Um Lugar Silencioso – Dir: John Krasinski - por Pedro Mauro
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Lembro de
não muito tempo atrás, ver Martin Scorsese falando sobre a importância do
silêncio no cinema. Para explicar isso ele usou a metáfora de que a tempestade
só parece tão caótica porque existe a calmaria como parâmetro. Junte essa
informação com o fato de que filmes de terror são um gênero difícil de
trabalhar. Isso porque o terror conta com algumas regras e convenções que só costumam
funcionar por que essas “leis” são seguidas. Sendo assim é sempre complicado
criar algo novo e de qualidade que chame a atenção hoje em dia.
O filme de
Krasinski quebra a grande maioria dessas convenções e se sai absolutamente
fantástico. Geralmente associamos terror com estar com medo, aquele medo que de
certa forma é eufórico e você fica ofegante. Mas aqui, a coisa é bem
diferente. A primeira sequencia de abertura já um deslumbre. Não sabemos nada,
estamos no dia 89, em algum lugar qualquer, e numa sequência absolutamente sem falas entendemos o clima
do filme: algo aconteceu e quem fizer barulho, morre. O incrível é a forma como
Krasinski trabalha essa premissa com muita simplicidade poética.
Na base do
“barulho significa morte”, vemos a família formada por Evelyn (Emily Blunt) e
Lee (o próprio John Krasinski) e seus filhos e como eles são ensinados desde
criança a sobreviver no silêncio. Através dessa simplicidade de uma família que
mora em uma fazenda com plantação de milho (uma influência clara de Sinais, de
M.N. Shyamalan), o roteiro é hábil em tirar momentos de tensão e medo que vão
com certeza fazer qualquer espectador se encolher na cadeira do cinema.
Muitos aos
poucos o filme vai nos mostrando o que aconteceu nesse futuro pós-apocalíptico
através de pistas deixadas pelo cenário. Ele não faz questão alguma de nos
entregar de bandeja toda a trama. E existe aí um clima meio J.J. Abrams, no
sentido de não ter pressa para mostrar o que causou praticamente a extinção da
vida humana. O roteiro também se livra com facilidade de clichês ou soluções
“deus ex-machina”. Isso tudo em um mundo onde o mínimo barulho tem as piores
consequências, tudo na casa e na vida doméstica da família foi adaptado para
não fazer qualquer som. O público se acostuma tanto com esse clima que nos
momentos de clímax é fácil ficar com o dedo na frente dos lábios como se
implorasse aos personagens para não fazerem barulho.
Com
praticamente 2/3 do filme completamente mudo, o filme também se esquiva
agilmente de “jump-scare’s” óbvios e que vem em momentos inesperados. Krasinski
soube construir genialmente como o espectador aprende que o barulho é motivo de
perigo e nos deixa em estado de alerta sem mesmo entender porque até que a
história siga adiante. Para um filme de terror com seres sobrenaturais é
incrível como o desenvolvimento da história é absolutamente crível. E esse é um
filme para ficar atento ao trabalho de som. A trilha sonora é extasiante porque
ela vem justamente nos momentos em que respiramos e não precisamos nos
preocupar com o barulho. Juntamente com isso a sonoplastia é impecável, quando
estamos acompanhando a filha (que é surda) não temos som, quando outros
personagens estão em foco, cada barulho é ouvido e nos damos conta do quanto é
difícil ser absolutamente silencioso se considerarmos a forma barulhenta como
vivemos hoje em dia.
Toda essa
ambientação é construída com precisão cirúrgica, acompanhada de um roteiro
muito humano, direção certeira e sem dúvidas, atuações perfeitas. Tudo tão em
perfeita harmonia que é quase impossível sair do cinema tentando não fazer
nenhum barulho como os atores em cena. Gosto de pensar no subtexto que John
Krasinski deixa por trás de uma boa justificativa. Qual é a nossa verdadeira
relação com os sons e barulhos do nosso dia a dia. Além disso, como um devoto
fã de Tarantino, achei impressionante como é Krasinski contou uma grande
história com muito drama, sem diálogos, e tanta verdade quanto os longos
diálogos corriqueiros do mesmo.
Um Lugar
Silencioso mostra a que veio desde de sua cena inicial até os créditos finais.
John Krasinski prova com tranquilidade que tem talento tanto na frente quanto
atrás das câmeras e principalmente que sabe trabalhar o gênero com elegância e
sem clichês. Acomode-se, desligue seu celular, respire fundo e se deixe levar
pela viagem sonora de Krasinski. Veja até onde o silêncio pode te levar e
lembre-se...sshhhh!
Nota – 6 estrelas